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12 de setembro de 2013

A Oração do Senhor: “E não nos deixeis cair em tentação”


Depois da invocação para remissão dos pecados, Jesus nos convida a suplicar ao Pai para que nos auxilie a superá-las.
O pedido “não nos deixeis cair em tentação”, como o recitamos, é ambíguo pelo fato que nos faz imaginar que seria Deus a nos induzir à tentação. Interpretação já rejeitada por São Giacomo que diz: “Ninguém, ao ser tentado, deve dizer: ‘É Deus que me tenta’, pois Deus não pode ser tentado pelo mal e tampouco tenta a alguém. Antes, cada qual é tentado por sua própria concupiscência, que o arrasta e seduz” (Tg 1,13-14), mas isso não o priva da responsabilidae pessoal.
A locução atual, inserida na liturgia da Missa, diz: “Não nos deixeis cair em tentação”. É uma súplica dirigida ao Pai para pedir que o peso da tentação seja proporcional às nossas forças, para não sucumbirmos.

Duplo significado da tentação

Afirma San Giacomo: “Feliz aquele que suporta a provação, porque, uma vez provado, receberá a coroa da vida, que o Senhor prometeu aos que o amam” (Tg 1,12). A terminação grega peirasmos tem no texto de São Giacomo um duplo sentido: aquele verdadeiro e próprio de tentação, isto é “sedução que leva à perdição” e vem sobretudo do diabo, e aquele de prova que prevê  a superação da tentação por parte do sujeito ao qual ela se impõe. Torna-se claro que a tentação-sedução ao mal não vem de Deus, porque Ele é o Bem Supremo. No Pai Nosso invoca-se o apoio do Pai, a fim de que não permita que a tentação, entendida como prova, seja um vento forte sobre nós, separando-nos de Deus.

Realidade das tentações

 “Não é talvez uma tentação, a vida do homem sobre a terra?”, se questionava Jó. E não hesitava a suplicar a Deus para ser liberto: “Perdi a esperança; absolutamente, não quero mais viver. Tem pena de mim, pois um sopro são meus dias!” (Jó 7,16). A figura de Jó aparece como representativa das tentações e provas que atravessam a existência humana.

 Diversidade das tentações

Existem intérpretes que acreditam que o pedido do Pai Nosso refere-se às tentações dos últimos tempos, que dependem da salvação eterna. Esta perspectiva escatológica não vai ser eliminada, mas o objeto do pedido não deve ser reduzido. Essas tentações constituem sempre uma prova ou experiência dolorosa e também perigosa, que poderia inclinar-nos para o mal. É natural, por isso, que quando recitarmos o Pai Nosso, invoquemos a ajuda de Deus para não sucumbirmos a elas.

O apóstolo João as denuncia e estigmatiza, chamando-lhes “a cobiça da carne, a cobiça dos olhos e a soberba da vida” (1Jo 2,16). Destas tentações consentidas derivam aquelas escolhas erradas que afastam do verdadeiro amor de Deus e ao próximo, disseminando o conflito, o sofrimento e a injustiça.

Entre as tentações mais comuns que o homem pode enfrentar, podemos indicar duas. A primeira, a excessiva preocupação com os bens materiais. Se são fruto de um trabalho honesto, estes bens são necessários e servem para construir um nível de vida humana e social dignos do homem. A segunda refere-se à atração exagerada pela riqueza, que fecha o coração do rico ao convite de Deus e às súplicas dos pobres.

 Provas que enfraquecem a fé

O tempo já é suficiente para perder o frescor da nossa fé, a debilitar, entristecer a nossa vida, impedir a nossa capacidade de trabalho e relacionamento, tornar-nos inquietos e pessimistas. Devemos vigiar e orar para que a fé, a caridade e a esperança cresçam com o passar dos anos e a sua solidez nos ajude nas pequenas e grandes provas da vida.

Pedagogia divina salvadora

Quando um cristão verdadeiramente crê no Deus da Revelação e acolhe na fé o dom da graça,  previne que este Deus faz exigências de fidelidade que o crente não deve menosprezar e cuja atuação é acompanhada por tentação ou prova. O evangelista Lucas afirma que depois do anúncio do Reino de Deus “todo homem se esforça para nele entrar”, (Lc 16,16).

Depois de haver dado a capacidade de resistir às tentações, Deus testa o coração do homem e o coloca à prova para verificar nele a fidelidade à aliança, induzir a confrontar-se com a sua Palavra que o libera da escravidão das paixões, salva e o traz para Si. Ele fez isso com Abraão, nosso pai na fé (Gn 21,1), o qual para obedecer a Deus teve de deixar a sua terra e suas posses para ir a um país desconhecido. Continuou a fazê-lo com Isaac e Jacó (Judith 8, 26-27), com Israel no deserto (Dt 8, 2,16), antes e durante o exílio (Sl 66, 10-12). Depois do batismo, Jesus foi conduzido pelo  Espírito ao deserto “para ser tentado pelo diabo” (Mt 4,1). Do Senhor vem a força para vencê-la.

Não podemos nos iludir achando que podemos chegar à salvação sem enfrentar as tentações. Isso está enraizado na nossa natureza, marcado pela consequência do pecado original e tem influência negativa sobre nossa existência. Diante das tentações, não podemos pretender enfrentá-las sozinhos. Deus cuida de nós, desde que acolhamos o dom da sua graça e correspondamos a Ele.

 Superação das tentações

Com a invocação do Pai Nosso, não pedimos a Deus para sermos preservados das tentações ou provas as quais estamos sujeitos, mas para estarmos dispostos a aceitar o peso para que não supere as nossas forças. A sedução da tentação vem do diabo, mas encontra em nossa fragilidade humana a possibilidade de ser acolhida. Por isso, imploramos a Deus que nos socorra com a sua graça, de maneira que mantenha operante em nós a energia interior da resistência e da superação para não sucumbir. A nossa súplica deve ser urgente, mas serena porque é baseada nas palavras de São Paulo: “Deus é fiel e não permitirá que sejais tentado além das vossas forças. Pelo contrário, junto com a provação ele providenciará o bom êxito, para que possais suportá-la” (1Cor 10,13).



Padre Agostino Favale, SDB, é professor emérito de História da Igreja Moderna e Contemporânea e de Espiritualidade da Universidade Pontifícia Salesiana de Roma, consultor da Congregação para a Causa dos Santos e autor de mais de 180 obras.
Tradução: Elaine Tozetto.

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