Adaptei o texto do site e coloco um resumo aqui:
Leia com atenção o trecho retirado da carta 2 página 15 do livro “Cartas entre amigos” do padre. Fábio de Melo e Gabriel Chalita (novo peemedebista aliado de Dilma) e veja se não há um certo relativismo nas ideias:
“(…) Por isso não tenho receio de afirmar que o específico das religiões não consiste em responder às perguntas, mas em nos ensinar a conviver com elas. Na tentativa de resolver os conflitos que nos afligem, corremos o risco de atentar contra a sacralidade dos fatos.
Dessa forma, deixamos de plantar as flores e insistimos em chorar sobre as pedras. Diante do sobrado demolido, Cora Coralina resolveu escrever o poema, pois sabia que as palavras poderiam resguardar o significado de tudo o que as pedras insistiam em sepultar. Gosto de compreender a ressurreição de Jesus da mesma forma.
Diante da ausência sentida, a saudade fez o apóstolo intuir e proclamar: “Ele está no meio de nós!”. O grito nasce do reconhecimento da transformação acontecida. Eles não eram mais os mesmos. O sobrado crístico já estava erigido na alma de cada um. João, o homem que era chamado “filho do trovão”, o homem de temperamento difícil, revestia- se de docilidade.
Pedro, o homem que mal sabia falar, o homem que foi frágil até o momento da morte do melhor amigo, estava mergulhado numa coragem invejável. Eles se olhavam e percebiam que Ele não havia ido embora, mas apenas modificara a forma de ficar.
Isso retira a necessidade que temos da materialidade da ressurreição. Não importa que haja um corpo encontrado ou um corpo desaparecido. (frase copiada do teólogo liberal Torres Queiruga) O que a ressurreição nos sugere é muito mais que um corpo material.
O mais importante, e o que verdadeiramente pode mover o cristianismo no tempo, não está na prova material da ressurreição, mesmo porque não a temos. O que possuímos, e isso ninguém pode contestar, é o fato de que os discípulos nunca mais foram os mesmos depois da vida, morte e ressurreição de Jesus (se não tem corpo, cadê ressurreição? – comentário meu). A declaração cristã “Ele está no meio de nós!” nos assegura a continuidade do plantio das flores.
Onde existir um ser humano comprometido com as palavras e a proposta de Jesus, lá Ele estará presente. Isso não é lindo, meu amigo? Teilhard de Chardin, teólogo jesuíta, chamava isso de “cristificação do universo”. Esta mística nos permite uma aproximação ainda mais interessante da eucaristia, acontecimento ritual que nós, católicos, chamamos de “presença real de Cristo”.
O que é a presença real? A matéria consagrada? O pão e o vinho somente? Não. Juntamente com as duas substâncias está o bonito e sugestivo significado da ausência.
A comunidade que celebra, enquanto celebra, prepara a chegada do que vai voltar. A volta de Jesus não é apenas um acontecimento escatológico, reservado ao final dos tempos, mas induz a comunidade a um comprometimento histórico com as dores do mundo. Jürgen Moltmann, grande teólogo alemão contemporâneo, aprofunda de maneira muito preciosa o conceito de esperança. Segundo ele, a esperança cristã é sempre operante, porque nos mobiliza a atualizar no tempo a presença do esperado.Com isso, podemos saborear a espera.
Ao socorrer os necessitados, podemos antecipar a volta de Jesus. Ao consolar o coração de uma mulher que perdeu um filho, e com ela sendo solidários, podemos dar início ao processo de sua cura.Isso também é celebrar o mistério eucarístico.
É deitar a toalha branca sobre o altar do coração humano, reconhecendo nele a dor que precisa ser redimida, e elevá-lo, em prece, aos céus. É a ausência humana sendo curada através da presença comprometida, movida por uma esperança operante, que encontra motivos para continuar na celebração sacramental que nasceu da ausência sentida.
O motivo da última ceia foi a preparação da ausência. Foi a oportunidade que Jesus teve de sacramentar em seus discípulos a coragem da continuidade. Nada mais bonito que preparar a ausência com um jantar entre amigos. O prato principal não era material. Do que eles precisavam era aprender a mística do alimento. Nós nos transformamos no que comemos. O que Jesus propunha não era um ritual de antropofagia. Comer e beber juntos significa estarmos comprometidos.
O banquete não é lugar para saciar somente a fome do corpo, mas também a fome da alma. Ao estar com os que amo para me alimentar, de alguma forma eu os trago para dentro de mim.Ao interpretar a transcendência do amor interpessoal, o filósofo Gabriel Marcel intuiu que amar consiste em olhar o amado nos olhos e dizer: “Tu não morrerás jamais!”. Ele pode ter aprendido isso ao contemplar a última ceia. Cora Coralina disse a mesma coisa, mas com palavras diferentes, que você citou em sua carta: “Não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico, na música de seus versos”.O amor nos socorre do esquecimento. Retira o poder definitivo da lápide, porque sobrevive na continuidade do que plantamos. Por isso a ausência é lugar de encontro.
Basta exercer a força da visão poética, a via que costuma salvar o mundo de seus desesperos e ruínas.Uma bonita expressão atribuída a São João da Cruz, o grande místico cristão, nos diz que “o que podemos conhecer de Deus são as pegadas de sua ausência”, uma frase que desconcerta os religiosos ávidos por sinais concretos. O que temos de Deus são vestígios. Por isso é tão importante não perder o desejo de procurar. Encontrar respostas é satisfação temporária. O bom mesmo é a investigação que nos mobiliza.
As teologias nascem dessas ausências. É a partir delas que as teologias postulam as suas verdades, porque a ausência é uma categoria cheia de sugestões.Volto à eucaristia.
O que celebramos e o que vemos é muito pouco perto de tudo o que verdadeiramente significa o rito. Não podemos materializar a eucaristia, retirando-a da totalidade de sua abrangência. Digo isso, meu amigo, porque reconheço suas dores como eucarísticas.
Assim como foi também a dor de Hannah Arendt, de Cora Coralina e de tantos homens e mulheres que semearam o mundo de flores e sentido.Da mesma forma que não posso reduzir a eucaristia a um detalhe de sua totalidade, também não quero reduzir sua carta a uma simples resposta.Permita-me dizer que suas perguntas, nascidas de suas ausências, saudades e indignações, em vez de me provocarem o desejo de lhe responder, fomentaram em mim muito mais silêncios que palavras. O pouco que escrevo é apenas um modo que tenho de dividir o que creio sobre tantas coisas, e que por ventura entra no contexto de suas falas. Talvez eu não tenha respondido absolutamente nada. Não importa. O mais bonito de tudo isso é saber que suas palavras me fizeram pensar nos sobrados que já reconstruí dentro de mim. Ausências às quais aprendi a atribuir sentido. Sofrimentos que antes eram capazes de me sepultar e que agora me sugerem experiência de plantio de flores.O mais importante é que no sacramental desta carta pude recebê-lo em minha casa e a seu lado deitar a toalha branca sobre o altar dos nossos significados, para juntos repetirmos no tempo o que nele não cabe.
A matéria que celebramos? Ainda não sei. Vou seguir o conselho do poeta. Vou conviver com ela e saborear o seu poder de silêncio, antes de encontrar as palavras que possam dizê-la ao mundo.
Obrigado pela eucaristia que sua carta me permitiu celebrar.
Confesso que, ao terminar a leitura, tive o ímpeto de repetir uma expressão ritual, aquela que assegura a sacralidade da palavra proferida: “Palavra da Salvação!”. No íntimo de meu coração, rezei dizendo: “Glória a Vós, Senhor!”.
Extraído do site: católicos conservadores
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